Registro Histórico




RUA JOSÉ DO PATROCÍNIO

            Com o crescimento da Vila de São Salvador dos Campos dos Goytacazes, no início do Século XVIII, houve a necessidade de se abrir novas ruas que pudessem interligar os diferentes pontos de suas atividades econômicas e residenciais. O fato começa a ser notado, segundo relato do historiador Júlio Feydit, no livro “Subsídios para a História de Campos dos Goytacazes (Editora Ésquilo, 1979, p. 280, 281), com a descrição de uma demanda entre a Câmara e o alferes Joaquim Vicente dos Reis, que se dizia dono das terras onde seriam abertas novas ruas a partir do aterramento da Lagoa do Rosário, questão somente resolvida por volta de 1820/1821, segundo registro na Folha 65 v, salientando o fato que os camaristas ganharam a causa.
            Dessa forma, podemos imaginar que o projeto das atuais Ruas Conselheiro Otaviano, José do Patrocínio e Rua Visconde de Itaboraí já existiam em 1802. A Cova d´Areia, antiga denominação da Rua do Conselheiro Otaviano, assim era conhecida até mais ou menos os anos 60 do século passado; Não há registro de um nome antiga da Rua José do Patrocínio, o que pode ter acontecido após seu falecimento, em janeiro de 1905, mas a Visconde de Itaboraí, até hoje ainda é nominada de Rua do Leão, pois, oficialmente, era uma homenagem à fazendeira Anna Leão.
            A homenagem a José do Patrocínio é, pois, das mais justas. No seu livro “Gente que é Nome de Rua”, o historiador Waldir Pinto de Carvalho, faz a este vulto histórico (p. 125) uma feliz e sentido alusão, principalmente a seus feitos, uma vez que passou a história com o título de “Tigre da Abolição”. Inclusive, publica sobre ele um soneto de autoria do poeta Claudinier Martins.

Grande orador, José do Patrocínio,
Na brônzea tez, no verbo alto e cantante,
Contra o do negro injusto esterquilínio,
Levanta a clava rútila, vibrante.

Da clara voz ninguém, preso ao fascínio,
Resiste, - pura, eustônica, flamante: -
Castiga o mau, condena o latrocínio,
Nos prélios do Direito triunfante.

As mãos do servo quebra insone a algema,
Abate o escravocrata, a potestade
Pleno na glória máxima, suprema.

Erguer-lhe a estátua inútil é vão intento,
Que não supera Sua Majestade:
- Ele é, na cor, o próprio monumento.

            Patrocínio, louvado em livros por muitos escritores, com destaque para seus contemporâneos Godofredo Tinoco, Jorge Renato Pereira Pinto e Herbson Freitas, nasceu em Campos dos Goytacazes no dia 09 de Outubro de 1853, filho do Vigário João Carlos Monteiro e da filha de escravas Dona Justina Maria do Espírito Santo, numa “antiga casa, na Praça do Santíssimo Salvador (onde hoje se encontra o edifício da Justiça Federal), esquina com o Beco do Barroso, atualmente Rua Inácio de Moura” (CARVALHO, p. 127).
            Suas lutas em prol da liberdade dos escravos culminaram com sua presença a assinatura da Lei Áurea, em sessão solene presidida pela Princesa Isabel, encarregada do ato oficial na ausência de D. Pedro II à Europa.
            Pressionado pelos republicanos e vítima de calúnias por parte das classes dominantes, que de repente, se viram sem sua mão de obra escrava, José Carlos do Patrocínio faleceu em 29 de Janeiro de 1905, com apenas 52 anos de idade. Seus restos mortais encontram-se no Panteão dos Heróis, monumento junto ao Palácio da Cultura.


Registro Histórico:

            O centro histórico da cidade de Campos dos Goytacazes foi praticamente consolidado, a partir do Plano Urbanístico do sanitarista Francisco Rodrigues Saturnino de Brito, planejado em 1902, muito embora as obras de organização urbana somente tenham sido iniciadas após 1906, como registra a pesquisa da Dra. Teresa de Jesus Peixoto Faria, no texto “As reformas urbanas de Campos e suas contradições”.
            Ela cita, em sua pesquisa, que havia, além da reformulação urbanística, a necessidade de resolver questões d falta de saneamento, responsável pelas epidemias, como a peste bubônica, que assolou o município, situação agravada pela grande enchente verificada naquele ano, resultando em inundações, o que levou o médico Dr. Benedito Pereira Nunes, idealizador da “cidade saneada”, a observar que, em 1906, nada tinha sido feito com relação ao projeto de Saturnino de Brito. E fez o seguinte discurso, publicado na Gazeta do Povo, solicitando a intervenção do Governo Federal:

Em 1901, quando presidia a Câmara Municipal de Campos, eu disse que, realmente, Campos, doada de uma natureza e de situação topográficas excepcionais e que poderia ser chamada a Sultana da Paraíba se transformou, por negligências da engenharia indígena e da edificação colonial numa cidade de ruas tortuosas, de becos e de ruelas escuras, cheia de casebres obscuros e insalubres, criando, assim, um ambiente de condições idênticas às das cidades asiáticas, onde a peste é endêmica. Os velhos casebres que existem ainda hoje e onde vive a classe operária pagando baixos alugueis, confirmam este estado de coisas. Atentados flagrantes às regras de higiene, legitimando de maneira criminosa o direito dos proprietários pouco escrupulosos, exploradores conscientes dos pobres moradores de casebres úmidos, verdadeiros pardieiros pagos com o suor das vítimas.


            Tetê Peixoto assinala: E é o próprio prefeito Ferreira Landim que, em novembro de 1906, anuncia, em discurso também publicado no mesmo jornal, no qual fala nas dificuldades para colocar a arquitetura de suas habitações de conformidade com os novos modelos em difusão: “O problema de salubridade das habitações exige, mais do que nunca, a atenção do poder municipal. É necessário melhorar as condições de higiene das casas, transformar o sistema de edificações, expurgar a cidade dos velhos casebres, focos de infecções de toda a espécie – da tuberculose e da peste, principalmente. No ano passado, fiz demolir nos termos da lei, 45 desses velhos pardieiros e as enchentes completaram, em parte, esta obra de saneamento (...)”. A reforma urbana na cidade de Campos dos Goytacazes obedecia, em tese, ao que era feito no Rio de Janeiro, nos tempos de Pereira Passos, por volta de 1904.
            Da lista de demolições de velhos edifícios, publicados em seu trabalho, que parecem prejudicar a imagem da cidade constam 32 demolições e foram condenados 16; construíram-se nove casas novas; 18 foram totalmente reconstruídas, e 16 parcialmente; foram feitos 48 grandes reparos e 217 pequenos reparos. E o Dr. Pereira Nunes, condenou a cidade “velha”, segundo ele, invadida por ratos. E reafirma que “Campos reclama de medidas como impermeabilização do solo e a abertura de áreas de circulação”,
            No documento, a pesquisadora salienta (...) O velho tecido urbano é transformado, progressivamente, graças às reformas que visam, além do embelezamento da cidade, dar-lhe uma melhor funcionalidade, adaptando-a aos interesses da economia capitalista e da burguesia em plena ascensão. Finalmente, neste começo do século XX, é necessário dotar a cidade dos símbolos do progresso e de uma imagem de modernidade.
            E ele descreve algumas mudanças operacionalizadas com as reformas do Plano Saturnino de Brito: “As Ruas: 21 de Abril, Sete de Setembro, Constituição (Rua Alberto Torres) e Formosa (Tenente Coronel Cardoso) foram alargadas; a antiga Praça das Verduras (Praça do Chá-Chá-Chá) foi urbanizada e transformada em praça de lazer; a Praça São Salvador, já com belo jardim, é ornamentada com uma fonte, os edifícios se renovam como o Renne, o Café High-Life,m Bom Marché e novos edifícios surgiram, como o do Banco do Brasil (1910), Associação Comercial de Campos (1913), Correios e Telégrafos e sede da Lira de Apolo (1917) e o antigo Teatro Trianon (1921). Desses citados, somente sobreviveram o Renne (com mudanças nos anos 50) e a Lira de Apolo (ora em restauração).
            Hoje, o conjunto de obras ecléticas, o maior do interior do Estado, praticamente está restrito às Ruas: 21 de Abril, Santos Dumont, Teotônio Ferreira de Araújo (antiga Barão de Cotegipe), Praça do Santíssimo, Sete de Setembro, 21 de Abril, Avenida Rui Barbosa, Rua 13 de Maio (antiga Rua Direita) e Rua Formosa (Tenente Coronel Cardoso), embora existam outros espécimes da época espalhados por outras artérias da cidade, atingindo até bairros mais distantes e em alguns distritos, como Goytacazes, Dores de Macabu, Murundu, Santa Bárbara, Vila Nova, Morro do Coco, Santa Maria e Santo Eduardo. Só para citar alguns...
            O centro histórico de Campos é, com outros avanços ocorridos nos anos 40, por intervenção da empresa Coimbra Bueno, nos tempos áureos do Prefeito Salo Brand, que era engenheiro, o que estabelece a Lei (Plano Diretor) 7.972, de 30/03/2008, quando se inicia, embora tardiamente, a se adotar uma política de preservação do patrimônio Histórico e Cultural do Município, cuidando de suas instâncias materiais e imateriais.


Inventário em:
Fotografia: Valdimir da Silva Salino
Responsável: Orávio de Campos Soares

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